sexta-feira, 21 de maio de 2010




A hora do cansaço

As coisas que amamos
as pessoas que amamos
são eternas até certo ponto
Duram o infinito variável
no limite de nosso poder
de respirar a eternidade

Pensá-las é pensar que não acabam nunca,
dar-lhes moldura de granito.
De outra matéria se tornam, absoluta,
numa outra (maior) realidade.

Começam a esmaecer quando nos cansamos,
E todos nos cansamos, por um ou outro intinerário
de respirar a resina do eterno.
Já não pretendemos que sejam imperecíveis.
Restituímos cada ser e coisa á condição precária,
rebaixamos o amor ao estado de utilidade.

Do sonho de eterno fica este gosto ocre
na boca, sei lá, talvez no ar.

Carlos Drummond de Andrade



Drummond consegue sintetizar sabiamente em ''A hora do cansaço'' todos os elementos característicos do âmago humano em suas relações afetivas . A entrega, a intensidade, a euforia e o ápice das emoçoes que se consolidam quando atribuimos ao outro o status de imortal.
E até mesmo o cansaço. Qual cansaço ?

'' E todos nos cansamos, por um ou outro intinerário.''

Abrindo um parênteses nesse verso, me proponho a questionar os fatores que estimulam o cansaço . Somos de ímpeto motivados a crer que o cansaço é sinônimo de desinteresse. Não é uma hipótese descartada, como Drummond mesmo disse :''todos nos cansamos por um ou outro intinerário''

Contudo posiciono meu olhar para outro tipo de cansaço . O esgotamento e a exaustão da alma em face da insensibilidade do objeto amado em perceber-se imperecível.


As pessoas que emolduramos com granito e eternizamos dentro de nosso limite são aquelas que um dia fingirão dormir ao telefone durante uma conversa, que nem levantarão para te cumprimentar quando você for visitá-las, que mudarão de assunto quando você precisar falar o que sente, que duvidarão de sua conduta moral, que te rotulararão quando mais necessitar de um abraço.


Não são as falhas daqueles que julgamos imortais que nos esgota, mas a falta de tato, de percepção e de sensibilidade para absorver em nossos olhos o quanto são especiais.


Esses fatores acima citados desgastam, entediam, cansam e causam fadiga na alma. ''Já não desejamos que sejam imperecíveis. ''


Restituindo cada humano a sua condição de mortal . Cansei também Drummond !!!

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