terça-feira, 12 de outubro de 2010

O segredo



Parece que não mudei muito, pelo menos no que se refere a coordenação motora. É o que dizem. Tive uma infância feliz como toda criança deveria ter. Assistia o programa da Xuxa, sim eu gostava de ver todo aquele ritual dela descendo da nave, do bom dia e claro dos desenhos. Brincava de casinha, amarelinha, dominó, abc, mandraque, pique-esconde, matança, polícia e ladrão, sete cacos, caiu no poço, minigame, pular corda, bambolê, gude, pega- pega. E quando as brincadeiras convencionais e saudáveis já não satisfaziam, lá estava eu na laje da casa, escalando as paredes , subindo nas árvores e garantindo as palmadas sagradas de todo dia ( não, não era todo dia) pelas aventuras de spider girl.

Tantas recordações cômicas e felizes de uma época onde preocupação não existia. E quando havia era apenas o medo de ficar de recuperação . E modéstia parte sempre fui boa aluna, tanto porque queria a tão sonhada bicicleta no fim do ano, como pela imagem assustadora da mão pesada de meu pai diante de uma suposta reprovação . Mas independente disso, eu realmente gostava de estudar e de fazer meus pai s sentirem orgulho de mim.

Minha rotina diária era mais que perfeita. Ter que escolher entre Xuxa e Angélica o maior dilema. Esperar a sessão da tarde para assistir Os goonies a maior ansiedade. Jiraya morrer? O maior medo. Isso sem falar que o drácula morava atrás da minha casa. Fato! Eu o via, sério. E não somente eu, meu primo Diego também via. E não éramos usuários de drogas. No crepúsculo, nós subíamos no muro e ficávamos esperando ele aparecer. Até que construiram casas e nosso contato visual com o nosferato ficou ameaçada. Lamentável.

Eu tinha um mundo á parte, não que isso tenha mudado após alguns anos, continuo com um universo particular, mas aquele mundo era especial.( Será que sou autista? )Principalmente porque ele tinha o tom e o sabor que eu lhe dava. As crianças são simples. Elas administram melhor a suas vidas do que os adultos somente porque elas não tem medo de ser o que desejam . Os risos, as críticas, os olhares de reprovação não as intimida. Elas conseguem ser felizes na simplicidade, mesmo sem ter consiência do que é ser feliz.

E hoje procuramos fórmulas em terapias, dinheiro e status social para sermos completos. Mas na verdade o segredo foi apenas esquecido, já nos foi revelado. Ele continua guardado em algum lugar que deixamos ao longo dos anos.

E eu tenho que confessar, não é só a coordenação motora a único vestígio que sobrou da minha infância, continuo com um hábito que não consigo desprender dele apesar dos anos: a curiosidade aguçada para ver as pessoas além do que os olhos físicos são capazes de alcançar. Não sou a mulher bionica. Eu sou poetisa. Sempre foi assim, sempre enxerguei com os outros sentidos, quando só olhar não bastava. Cada um tem o seu dom decoberto na infância, porque é justamente nesse período que nos permitimos ser tudo aquilo que desejamos.





sábado, 9 de outubro de 2010

Que o silêncio seja mais
Que a palavra for capaz
De me tocar
Se orgulho satisfaz
Eu rejeito a tua paz
Ousa-me, desafiar

Eu vou arrancar essa ironia dos teus olhos
Eu vou desfazer esse sorriso do seu rosto
Dá-me tua fúria, me provoca que eu provo
Como gosto do teu gosto
Eu vou adentrar essa loucura que te toma
Me apossar e te fazer sair do coma
Não tenho medo de tuas trevas que me leva
Ás profundezas desse drama


Te rastreio no escuro
Teus segredos tão desnudos
Quero inflamar
Me perder em teu bioma, invadir tua entranha

Deixa eu te desafiar





quarta-feira, 6 de outubro de 2010


Percebe-se o fim desde o princípio
Poque o início caminha para um desfecho
Assim como o pretérito foi presente
Tudo que surge um dia finda
Adia-se ao máximo a despedida
Cogita-se formas de ludibria-la
Aumentando o tempo com vazios
Eternizando minutos e segundos
A angústia de quem não quer perder
Funde-se com a certeza do adeus
Sem saber que ele é tão vil e cruel
Que sorrateiramente deixa a ausência
Como um sinal daquele que partiu






sábado, 2 de outubro de 2010

Metamorfose


Me fecho, me escondo

Me cerco, me afasto

Dos outros, do todo

De mim, de meus atos

A margem do mundo

O mundo no quarto

Pensando no escuro

De mim, eu me farto

Trocando de pele

Mudando o sabor

Insípida, inodora

Invisível, incolor

Rompendo os poros

Da alma que inflama

Renovo-me, renasço

Quieta sob as chamas